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Sobre as contradições do vinho

Sentiram o vinho entrecortando seus corpos
Hálito leve, úmido, indelével, indecifrável
Desejos apócrifos, mais nitidamente apostos
Entre um olhar e outro, entremear solto

Estavam prontos e certos já há algum tempo
Mas não contavam com a lógica e o acerto
Apenas com a imprecisão sólida do vinho
E suas dimensões afetivas, fálicas, dionisíacas

Sabiam dos perigos, das limitações imanentes
Das combinações transcendentes e dilacerantes
Por isso o desespero, a agonia, o desvelo, o vinho...
E esse indigente, incontido e fiel desassossego

Um pouco mais de vinho na taça e ardor nas mãos

Havia muito mais sentido no toque e desespero da razão
Mesmo assim não impediram, não contiveram o rito
Prazer lânguido, insólito, mas não menos sagrado


Mais que vinho: verdade, vontade, volúpia
Renascentista e jovial presença, plena de excessos e mundos

Assim demarcaram seu campo do possível
Não haveria espaço para lamentações e culpas


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