Dentro da categoria de educadores existe o professor de Designação Temporária, ou simplesmente o "DT". O professor DT é uma espécie de “não-ser” da educação. Governo do Estado do Espírito Santo - imoral e ilegalmente - com a cumplicidade do Sindicato (que faz vista grossa) e da Justiça (que nada vê) mantém esse tipo de contratação que possui, em seu cerne, um evidente resíduo escravocrata. Os professores DT´s representam cerca de 70% do total de professores da Rede Estadual de Ensino do Espírito Santo. Esse tipo de contratação só é permitida pela lei em casos extremos, em regime de máxima urgência e necessidade, mas o Governo do Espírito Santo faz da exceção uma norma, mesmo contrário a lei e a ética. Os professores DT´s estão sempre sujeitos à dispensa sumária e pior, sem os direitos legais estabelecidos pela Legislação Trabalhista brasileira; ou seja, o direito do DT é não ter direito.
O professor DT vive sempre sobre constante pressão, sempre ameaçado por diretores, pedagogos ou coordenadores de ter o seu contrato de prestação de serviço cancelado a qualquer momento. Não tem direito a receber o FGTS, não participa da maioria dos cursos de formação, não pode se posicionar criticamente nas escolas, não tem direito a remoção e, além disso, está sempre inseguro sobre seus projetos de vida, pois nunca sabe se no ano seguinte estará garantido em sua função. Sorrateiramente o Estado, quando faz concurso, disponibiliza um número ínfimo de vagas, mantendo a estratégia de ter o quadro com maioria de professores DT´s.
Para o projeto de dominação, desmobilização de classe e moeda de troca, os DTs são de enorme utilidade para os “políticos”. Menos, é claro, para se construir um projeto educacional sério. A estratégia de subjugação e humilhação, em relação aos professores DT´s, está posta sob o signo da ameaça e do terror psicológico por parte dos seus superiores; sabemos que muitos companheiros não aderiram ao movimento de greve por estarem sofrendo ameaças explícitas. Com isso fica mais fácil para o Governo controlar o descontentamento e enfraquecer as lutas por melhorias de salário e condições dignas de trabalho. Nas cidades do interior do Estado, principalmente, a maioria das vagas de DT´s são loteadas entre políticos locais; são eles os que realmente determinam, de acordo com seus interesses, quem serão os escolhidos. São os professores servindo de engorda a uma prática herdada do coronelismo rural que ainda vigora: o curral eleitoral.
Mais existe ainda uma coisa mais degradante e humilhante que perpassa a dimensão de ser um professor DT: ele não tem direito a enterrar seus mortos. Os DT´s não possuem direito legal de chorar, velar e enterrar pela perda de um querido. Imaginem a cena, por exemplo, de alguém sobre o impacto e a dor de perdido a mãe e, ao chegar na secretaria da escola com o atestado de óbito para justificar e abonar sua falta, ouvir que ele não possui esse direito porque é um professor DT.
Sabemos que a escola, o professor, o conhecimento, o sistema de “transferência” de saberes e preceitos éticos que se denomina “educação”, é considerado o suprassumo da civilização ocidental, da qual nós, como brasileiros, fazemos parte por herança colonial. Mais do que isso, é visto como o que caracteriza e nos distingue como “civilização”. Não somos aborígenes, selvagens ou bárbaros: somos “civilizados”. Sabemos também que qualquer comunidade humana minimamente organizada e simbolizada, mesmo sendo considerada por nós como “primitiva” ou “selvagem”, tem o princípio ético de respeitar, homenagear e cultuar esse momento de extrema dor e significação humana que é a morte. Mas os professores DT´s - eméritos representantes e arautos dos valores desta mesma sociedade dita “civilizada” - não possuem esse direito.
O paradoxo disso tudo é que essa ação de imoralidade, humilhação, desrespeito e ilegalidade é constituída e mantida pelo próprio “Estado de Direito” que, em suas Leis de Diretrizes Básicas para a educação, prega “o pensamento crítico, a ética e a cidadania”, como seus pilares fundamentais. Se concordamos, então, que o ser humano - por ter “consciência” de sua temporalidade e finitude - tem na perda e no luto um dado que certamente o distingue dos animais, enxergamos claramente a forma como o Governo do Estado do Espírito Santo vem tratando os profissionais que sustentam e constroem o processo de formação da sociedade capixaba através da Educação.
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