A questão racial no
Brasil foi sempre ideologicamente camuflada em nome de uma suposta
“harmonia racial”. Olhando a história educacional no Brasil
vemos claramente a configuração de um ideário que determina a
hegemonia da cultura branca europeia. Os livros didáticos infantis
só continuam imagens afirmativas de crianças brancas, não havendo
um reconhecimento da dignidade e legitimidade de negros e índios.
Sabemos da difusão sistemática e histórica, de diversas formas, desse imaginário de segregação e desconsideração dos negros e indígenas; lembramos que as meninas negras queriam e usavam bonecas brancas e louras para brincar, que achavam seu “cabelo ruim”, que “negro quando não caga na entrada caga na saída”, que “índio é bicho preguiçoso”, etc.. Hoje temos o desafio inadiável de desconstruir essa ideologia etnocêntrica branca e inserir, na práxis pedagógica, o reconhecimento afirmativo da imagem e da herança cultural – que nos perpassa enquanto brasileiros – das outras matrizes étnicas. Essa dinâmica não se estabelece apenas como uma questão apenas de “formação continuada” dos educadores, mas um posicionamento ético que exige determinação e compromisso.
Para refletirmos as
relações raciais e a forma de como são constituídas as
ideologias, não podemos deixar de considerar - como educadores
críticos - o papel da mídia nesse processo de configuração da
imagem negativa, sobretudo na população negra. Diariamente as
páginas policiais dos jornais colocam “bandidos” negros sendo
presos ou criminalizados em suas ações, o que muitas vezes não
possui muito fundamento; estes já estão socialmente condenados. Em contrapartida, esses mesmos, jornais não dão a
mesma ênfase e tratamento quando se trata de “jovens da
classe média”; é evidente a ridicularização e
a criminalização da população negra pelos meios de comunicação em larga escala.
Na televisão o caso é
mais sério, pelo seu poder de difusão e massificação de ideias.
Numa lembrança rápida, vemos que a televisão brasileira realizou
uma “limpeza étnica” no imaginário coletivo. O que foi colocado
ao longo de anos de domínio da Rede Globo – sobretudo nas novelas
– é a ausência total de uma imagem positiva do negro; ele só
aparecia hegemonicamente como serviçal ou bandido. Só muito
recentemente algumas figuras negras começaram a aparecer em posição
de destaque e com uma imagem positivamente construída, mas escondem
os conflitos, a hierarquização e os problemas sociais brasileiros; as mazelas
da miséria, da desigualdade e do extermínio de jovens - que são em
sua maioria negros - não são expostos. Atuei como professor de Filosofia no Sistema Prisional e
quando me perguntam como é a cadeia respondo: é negra.
Também programas como
“Central da Periferia” criam uma falsa visão de “sucesso”,
mostrando uma “periferia” alegre, brejeira, erótica e
faceira, individualizando a superação da pobreza e a chegada ao
sucesso, utilizando jogadores e pagodeiros como modelos dessa
“ascensão social”, deslocando a necessária reflexão e
enfrentamento da verdadeira guerra civil que assola favelas e
comunidades periféricas nos grandes centros urbanos brasileiros.
Não são tocadas as
questões do acesso de modo amplo à riqueza gerada e as
possibilidades de mobilidade social – sobretudo com uma educação
pública de qualidade a todos – de modo sério e contundente como
deveriam ser. O racismo e a discriminação estão muito presentes e
disseminados nos aparelhos ideológicos e o educador, com
preocupações sociais e envolvimento histórico, tem uma função de
vital importância na mudança dessa mentalidade e tem a
responsabilidade ética de enfrentar e dinamizar a construção de
uma imagem positiva da população negra e indígena.
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