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Meninos da rua

Os meninos foram prá rua.

Se indignaram, se mobilizaram, se encorajaram e nos chamaram.
Reacenderam em nós aquela velha chama da luta.
Nos mostraram que temos força e poder.
Que coragem é um exercício de vida e não um dom.

Os meninos foram prá rua.

Eu e muitos outros que talvez tivessem até perdido a noção da liberdade
e da capacidade de indignar-se, nos juntamos a eles.
Erguemos nossos braços, gritamos palavras de ordem, trocamos olhares,
nos demos às mãos, nos abraçamos, nos fizemos irmãos, nos sentimos nação.
Irmãos de guerra, de batalha, de combate e de disposição.
Mas sobretudo irmãos de afeto.
Afetados que estávamos pela mesma indignação.
Nos tornamos afetuosamente cúmplices.

Os meninos foram prá rua.

Enfrentaram armas, bombas morais e imorais, se expuseram,
colocaram suas caras e seus corpos à mercê dos ataques da milícia armada .
A milícia Governamental. A milícia oficial. A milícia paga.
A milícia treinada. A milícia rude.
A milícia covarde.
Mas não houve medo e apatia.
A covardia foi enfrentada e vencida.

Os meninos foram prá rua.

Nos tiraram dessa comodidade, dessa passividade,
dessa imobilidade, dessa incapacidade.
E nos ensinaram a ser novamente povo,
e mais ainda:
que o ser povo é construído na rua.

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