Há cerca de sete anos perdíamos a genialidade singular do grande músico, compositor, arranjador e poeta Jaceguay Lins. Mas precisamente no dia 17 de agosto de 2004. Seu sepultamento ocorreu no dia seguinte ao óbito, no cemitério de São Domingos, na Serra, numa tarde de quarta-feira ensolarada, tendo ao fundo o som dos tambores de Congo, executado por seus amigos mais próximos, que atendiam a um pedido do próprio Maestro.
Natural da cidade Canhotinho, Pernambuco, Jaceguay Lins chegou por essas bandas no início da década de oitenta, vindo do Rio de Janeiro. Nesta época ele ministrava aulas no Instituto Vila-Lobos, mas havia sido “convidado” a se retirar por supostas atividades subversivas. E aqui no Espírito Santo “sentou praça” para estabelecer uma relação profunda e visceral com nossa cultura, fato que o coloca como uma das figuras mais contundentes das artes capixabas. Com um profundo conhecimento musical e vasta visão de mundo, desenvolveu trilhas para filmes e peças de teatro, arranjos e composições para diversos trabalhos, montou óperas, foi regente da Orquestra Filarmônica e, principalmente, desenvolveu no campus da UFES um movimento a partir da formação de um grupo de pesquisa étnico-musical denominado Banda Dois, que revelou o Congo para a juventude universitária capixaba, ganhando destaque nos meios de comunicação e tendo uma grande influência para que essa expressão viesse a ser reconhecida como uma das mais importantes manifestações culturais do nosso estado.
Apesar de sua formação acadêmica como maestro e regente, a alcunha de “erudito” não é adequada para se referir a Lins. A separação entre conhecimento “erudito” e “popular” não fazia muito sentido para sua inquieta e criativa cabeça. Essas “linguagens” - ou modos de ser - não eram para ele excludentes, sendo por ele utilizadas com igual intensidade e justaposição, para trazer à tona sua anárquica e revolucionária estética musical. Essa sua atitude ou lida com elementos considerados tão díspares, que pode ser verificada em todas as suas obras, mais radicalmente no disco “Melodiário”, que explicita a radical proposta de fusão das referências citadas, desenvolvida tendo como fonte de inspiração o imaginário cultural do Espírito Santo, tendo como principal referência o Congo.
Expressionismo, impressionismo, experiências com música aleatória e concreta e, mais contundentemente, o que os “especialistas da erudição” isolam - num misto de estranheza e indiferença - como “folclore”, faziam parte de seu caldeirão sincrético. Mas Jaceguay Lins usava essas referências com criatividade e originalidade, sem modismos oportunistas e interesses comerciais, respeitando e referenciando sempre os mestres populares .
O que considero mesmo relevante aqui é ressaltar a importância e a dívida de reconhecimento que o nosso estado tem com uma figura que tão grandes contribuições deu para nossas artes, influenciando toda uma geração de artistas e intelectuais. Jaceguay Lins, ao desvelar outros aspectos significativos que constituem nossa gente, instaurou uma nova maneira de ver e se relacionar com a diversidade cultural capixaba. A benção, grande Maestro Lins!
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parabéns.
Marta Gagno